quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Preciosidade.

"Há uma obscura lei que faz com que se proteja o ovo até que nasça o pinto, pássaro de fogo."

CLARICE LISPECTOR em Laços de Família.

Meu amigo.

Era alto e tinha orelhas de pavio grande, andava sempre alinhado e com o jornal do dia nas mãos. Era meu amigo; destes amigos de conversar e ficar horas em silêncio sem incomodar. Nada lhe deixava mais triste do que seus filhos, mais precisamente as atitudes de seus filhos, que eram três; três homens altos e de orelhas de pavio grande e que andavam sempre alinhados, mas que não tinham metade da elegância do pai. O meu amigo tinha elegância pra tudo, nunca o vi arrotar nem soltar um pum, falava na altura certa de se ouvir com clareza, com pausas e olhos nos olhos ou no horizonte.

Lia jornal, mas pouco fazia comentários. Preferia mesmo contar histórias; histórias de sua infância, principalmente do tempo que morou na fazenda. Não tinha rio pra tomar banho na fazenda e nem cavalo pra montar, mas tinha cacau, cobra e barcaça. Tinha planta de raiz perfumada, caju, limão-balão e galinha com pintinhos correndo atrás. Era tudo tão gostoso na fazenda... A estrada até lá era perigosíssima! Se chovia então, nem se fala! Só se viam os barrancos descerem das encostas montanha abaixo! Naquele tempo tinha um par de botinhas de borracha vermelha. Não saía sem elas, mesmo pra escola ia de botinhas vermelhas; eram botas de explorador.

Ele me chamava por um apelido e me achava graça, nem sei bem por que, mas me achava graça. E volta e meia quando estávamos juntos me levava pra comer pastel com caldo-de-cana no comércio. Andando pela rua, cumprimentava um monte de gente e eu me perguntava como que tanta gente o conhecia. Parava e falava de coisas da prefeitura que eu pouco entendia. Eu só olhava e achava bonito, ficava ali plantada do ladinho dele só observando e achando tudo bonito. E tinha gente estranha que depois eu dizia “Aquele ali num gosto não!”, e ele dava risada, mas não falava nada.

Ah, esse meu amigo... pedi tanto por ele! Ele me faz tanta falta; como faz falta alguém pra captar a nossa atenção e direcionar nossos pensamentos. Não éramos nada íntimos, bastáva-nos a companhia um do outro, geralmente no fim da manhã (quando eu estava de férias), ou no meio da tarde (quando as aulas começavam), sempre no banco da praça em frente de casa. Só o doido da lata que às vezes roubava o nosso lugar.

Lembrei agora do azedo do beribéri; tinha beribéri na fazenda e era azedo mais que o limão!

Helena.

domingo, 15 de agosto de 2010

Cinderela do caos.


Dark Cinderella de byluluka (imagem).
Disponível em: http://byluluka.deviantart.com/art/Dark-Cinderella-70231981?offset=20

Ser “metamorfose ambulante” cansa.
Ser “as pessoas da sala de jantar” cansa.
Ser o que tiver de ser cansa.
É uma chatice só!
Sou grossa com quem me ama,
Reclamo de tudo e de todos,
Qualquer barulho me incomoda,
Qualquer odor me enjoa.
E só me resta fugir;
Seja pra liberdade de uma canção,
Ou os braços de um amor que não existe.
É mais um tropeço na vida:
Tropeçar sorrindo a vida inteira.
Fugir pra ser feliz!
Eu sou a massa
Muda e sem pensamento,
Eu não grito, e se escrevo,
É porque escrever também é sorri!
Sou a cinderela de unhas vermelhas
A fugir do caos maravilhoso do baile,
De volta pra casa dos sonhos,
Onde nada existe, mas tudo é possível.

Helena.

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Caleidoscópio.

Se eu disser “Não” ninguém acredita. “Sim” seria o mesmo que cobrir-me de vergonha! Calar me sufoca, e escrever nem sempre é a solução.

A casa anda arrumada que chega dói e o chocolate sobra na geladeira... Bebo coca quando acordo e nunca me lembro de desligar a TV ao dormir. Entro pra vadiar na web e percebo está me tornando uma psicopata; visito sempre a mesma página e acaricio com o cursor a mesma foto. Saída tenho, mas continuo presa por vontade, lembrando...

Aos poucos vou deixando escorrer meus delitos nas palavras; vou me entregando sílaba a sílaba, tomando todo cuidado pra não ser pega em flagrante. Uma coisinha aqui, outra ali, e assim caminho. Em mim, uma profusão de lembranças. Nas palavras, imagens distorcidas, mal acabadas.

Alguma coisa me diz, ou é só mais uma esperança vã, que ainda não acabou. Já não seria nada como antes (nem poderia ser), mas não acabou. Vejo a ponta do dedo recostada nos lábios, logo depois os braços cruzados e então ouço o som, sinto o cheiro, tenho a sensação do toque! Ter sido é um laço difícil de se desfazer.

Que nojento tudo isto! Quanta bobagem! Estou brincando com o tempo e ele não está nem aí pra mim... Ou ela. Ora, ora... Se fosse pra ser claro eu não escreveria embaraçado!

Fato é que Jonathan está me deixando entediada com seus "Batedores" e "Yahoos". Quero outro livro pra ler... Talvez Clarice, Virgínia, Miguel...

Helena.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

A mesma viagem - Ler e Divagar.

Lá vou eu descrevendo coisas e situações... Estou cheia disto! Sempre a mesma forma, o mesmo estilo, a mesma viagem! O caminho sei de cor, as pedras chutei todas barranco abaixo. Se houve calos, secaram. Não mais que minha garganta, mas secaram e já não incomodam. A sede é grande e move o corpo na direção da fonte. Fui tantas vezes por estas paragens ausentes de tudo, que sinto ter me tornado ausente também. Mas tenho sede...

Dormir pensando nesta viagem e acordei sem lembrança alguma. Mas o que será mesmo que pretendo? Que pretendemos todos nós? Não seria mais digno ficar e morrer, do que ir ao encontro do que nunca nos satisfaz? Procissão de tolos. Caminha mulher, caminha homem! Busca lá os seus prazeres; líquidos derramados com muito esforço.

Vi num olhar que passava ares de simplicidade e eu poderia jurar ser o olhar de uma criança. E me disse esse mesmo olhar “Deus te abençoe.” Plantaram uma semente no barro e vejam só que belo olhar ela brotou!

São quase nove horas da manhã, o banco abre as dez e eu nem tomei banho ainda. Chega de letras! A viagem é longa e o tempo vai saber se eu quiser sair da fila. Não quero está diante do tempo, pelo menos não antes da hora marcada. Antes quero mesmo é a fonte e suas águas claras...

Helena.
Para Fábrica de Letras

domingo, 1 de agosto de 2010

Pequeno monólogo do desamor:


Fotógrafo(a) desconhecido(a).
Disponível em: http://doliquidificador.blogspot.com/2009/06/mas.html


“Estou bem. Nada de mais, fiquei em casa mesmo... Como assim? Não sei o que dizer. Não! O problema não é você, sou eu. Eu não me reconheço mais. Pensei nisto também, mas sei lá... Estou me sentindo sobrecarregada, não vejo mais as coisas como antes; é como se tudo tivesse acontecido há muito tempo. Você quer tomar alguma decisão? Sei. Conversei com ela, só ela me entende, e ela cantou a pedra direitinho! Eu não saberia como contar pra você, você não me entenderia. Estou confusa, é tanta coisa! Só eu posso me ajudar. Acho mesmo que estou precisando de umas férias, férias de tudo, férias de mim mesma!

Talvez no fim de semana eu faça isto. Hum... Quarta tenho prova e na terça o professor vai fazer uma revisão. Preciso ir, não estudei nada! Sexta também tenho prova e no domingo o aniversário que falei, quero ver se sábado vou fazer minhas unhas depois do trabalho.

Não dormir quase nada esta noite (risos). Já estou acostumada. O celular esquenta que perece que vai pegar fogo! Dou tanta risada! Tenho aprendido muita coisa... O problema sou eu; eu que me entrego de mais, que converso de mais. Dou tanta risada! Tanta risada! Ficamos a madrugada inteira uma imitando a outra, pode? Não, não é fácil assim não; demorou um tempão, eu é que sei! A tá (risos).

Estou ocupada agora. Vou ver... Se dé eu ligo mais tarde. Está bem, tchau.”

Helena.